Não estávamos vivos de verdade, estávamos próximos da vida, mas nunca a concretizávamos.
John Fante, Pergunte ao Pó, pg. 119 (José Olympio)
Não estávamos vivos de verdade, estávamos próximos da vida, mas nunca a concretizávamos.
John Fante, Pergunte ao Pó, pg. 119 (José Olympio)
Nao receie a adversidade: lembre-se de que os papagaios de papel sobem contra o vento e não a favor dele.
– Hamilton Mable
Ao longo da jornada, você ganha e perde a família, os amigos, o amor que tornam a vida suportável e insuportável.
Paul Auster (Org.), Achei que meu pai fosse Deus e outras histórias verdadeiras da vida americana. Companhia das Letras, pg. 366.
“Eu diria”, sugere um personagem do romance A Landing on the sun, de Michael Frayn, “que a felicidade é estar onde se está e não querer ser outra pessoa.”
Quando acordo de manhã, não é raro para mim, como para várias outras pessoas, passar alguns milésimos de segundo tateando em busca do meu eu. O despertador toca, e experimento um período de um minuto de desorientação no qual luto, normalmente com sucesso, para remontar os contornos de personalidade que foram dissolvidos pelo sono em suas relações familiares.
Talvez lutar não seja a palavra certa, pois há, com a notável excessão de uma versão radical dessa reconstrução diária (quando estou, por exemplo, viajando e já no terceiro quarto de hotel desconhecido da semana), pouco esforço consciente em torno do processo. É mais como a volta de uma mola à forma original, como se eu fosse um brinquedo de apertar com uma espécie de desejo involuntário de voltar à integridade de seus contornos originais.
Como consigo sair das profundezas do esquecimento e me encontrar renovado a cada manhã? Eu me lembro, antes de mais nada. De repente, tudo retorna: o estoque de experiências arquivadas, percepções recordadas e juízos habituais que formam a maior parte do monólogo interior que conheço como meu eu.
Suponha, por um instante, que esse processo comum de encontrar nossos eus de memória fossem, por alguma razão, interrompidos. E se, uma manhã, eu descobrisse que o mundo de minhas memórias não tornasse a se encaixar da maneira normal? Haveria algum sentido no qual eu continuaria a ser eu mesmo?
Ou suponha que, em vez de nosso repertório de memórias, a alteração matinal fosse, como aconteceu com o Gregor Samsa, de Kafka, corporal? Não sei bem o que pode acontecer depois, pois agora estou sozinho de uma forma que mal pode ser imaginada; Aonde posso ir? O que posso dizer? Quem posso chamar?
Portanto, a identidade pessoal se baseia (no mínimo) em dois critérios: a continuidade da memória e a integridade do corpo. Apesar de os filósofos terem, ao longo do tempo, tentado argumentar que um é mais importante que o outro, ou suficiente em si mesmo, parece que precisamos das duas linhas de continuidade para conseguir cumprir a tarefa simples de reconhecer nossos amigos, cumprimentar nossos conhecidos ou nos ver no espelho. A identidade pessoal fundamenta nossa existência individual e também estabelece as fundações da vida social e cultural.
Mark Kingwell, Aprendendo felicidade, Relume Dumará, 2006, pg. 143, ligeiramente adaptado.
O que eu sinto eu não ajo.
O que ajo não penso.
O que penso não sinto.
Do que sei sou ignorante.
Do que sinto não ignoro.
Não me entendo e ajo como se entendesse.
Clarice Lispector
Amo o pensador orgânico porque só para ele as verdades emanam mais de um suplício interior que de uma especulação gratuita. Ao homem que pensa pelo prazer de pensar contrapõe-se o homem que pensa sob o efeito de um desequilibrio vital. Amo o pensamento que guarda um gosto de carne e sangue, e a uma abstração vazia prefiro mil vezes uma reflexão surgida de uma exaltação dos sentidos ou de uma depressão nervosa. Os homens ainda não compreenderam que o tempo das preocupações superficiais é passado, e que um uivo de desespero é mais revelador que o mais sutil dos argumentos e que uma lágrima tem sempre origens mais profundas que um sorriso.
Emil Cioran, Nos cumes do desespero, Obras, pg. 31-32.
Existem pessoas que pensam apenas com o cérebro, enquanto outras pensam com todo o corpo e toda a alma, com o sangue, com o tutano dos ossos, com o coração, com os pulmões, com o ventre, com a vida.
Miguel de Unamuno, Do sentimento trágico da vida, Martins Fontes, p. 2.
“Meu passado torna-me irmão de tudo”. – Albert Jacquard
Essa afirmação corresponde, em primeiro lugar, à minha realidade biológica. Nessa ótica, meu passado é minha genealogia, se é reconstituída no período de seis milhões de anos, recuando até a origem do gênero Homo, sou aparentado com todos os seres humanos; no período de três bilhões de anos, recuando até a origem dos seres vivos, sou aparentado com todos esses seres vivos; no período de quinze bilhões de anos recuando até o big-bang, sou aparentado com tudo o que existe no universo. Foi o que expressou São Francisco de Assis, ao dirigir-se não só a seus “irmãos pássaros”, mas à sua “irmãzinha água”. É também o que expressam, com outros termos, os astrofísicos, quando afirmam que somos “poeira das estrelas”.
No entanto, meu passado é também o conjunto do que recebi das gerações precedentes. Sem ter pleno conhecimento disso, sou o produto de todas as angústias, de todas as esperanças, de todas as reflexões dos seres humanos que viveram antes de mim.
Albert Jacquard, Filosofia para não-filósofos, Campus, pg. 49.
É tão lindo que chega a doer…
Há uma aliança possível entre a lucidez e a alegria?
Clément Rosset
Venho não sei de onde,
Sou não sei quem,
Morro não sei quando,
Vou não sei onde,
Espanto-me de ser tão alegre.
Martinus von Biberach