Arte, Íntimo & Pessoal

Carl Spitzweg, “Den Besuch” (1855)

Uma ilustração que trago comigo faz muitos anos para que eu nunca perca a capacidade de me surpreender, principalmente em se tratando dos detalhes mais pequenos…

der_besuch.jpg

Carl Spitzweg, “Den Besuch” (1855)

Clique sobre a imagem e selecione “exibir imagem” para tamanho maior.

Excertos, Leitura

Razões para ler

O homem constrói casas porque está vivo, mas escreve livros porque se sabe mortal. Ele vive em grupo porque é gregário, mas lê porque se sabe só. Esta leitura é para ele uma companhia que não ocupa o lugar de qualquer outra, mas nenhuma outra companhia saberia substituir. Ela não lhe oferece qualquer explicação definitiva sobre o seu destino, mas tece uma trama cerrada de conivências entre a vida e ele. Ínfimas e secretas conivências que falam da paradoxal felicidade de viver, enquanto elas mesmas deixam claro o trágico absurdo da vida. De tal forma que nossas razões para ler são tão estranhas quanto nossas razões para viver. E a ninguém é dado o poder para pedir contas dessa intimidade.

 

pennac.jpg

 

Daniel Pennac, Como um Romance (Rocco)

Excertos, Filosofia

Sêneca

Deve-se misturar e alternar a solidão e a comunicação. Aquela nos incutirá o desejo do convívio social, esta, o desejo de nós mesmos; e uma será o remédio da outra: a solidão curará nossa aversão à multidão, a multidão, nosso tédio à solidão.

 

Sêneca, Sobre a Tranquilidade da Alma (Nova Alexandria, 2001, pg. 69)

Excertos, Livros, Questões

Clémence

martinpage1.jpg

Agora, Antoine, retomemos a partir do momento em que você dizia que eu sou fantástica.
– Eu dizia que você é severa.
– Você é muitíssimo injusto. Você não sabe julgar?
– Eu tento, mas é difícil.
– A minha teoria é que se pode compreender e julgar. A gente julga justamente para se defender, porque quem tenta compreender a gente? Quem compreende os que tentam compreender?
– Lacenaire dizia que os únicos que estão capacitados para julgar são os condenados.
– Então, se é assim, nós somos os condenados – disse Clémence abrindo os braços. – Eu sempre fui condenada, desde pequena fui julgada com sentenças silenciosas. É bonito o que eu disse, não?

Martin Page, Como me tornei estúpido (Rocco)

Frases, Poesia

Versos

Las raíces de los árboles – con agua del cielo sueñan.
17-III-28, Miguel de Unamuno

Unamuno foi e sempre será uma das maiores alegrias da minha vida, sempre me dizendo o que eu precisava ouvir, exatamente do único modo que poderia ser dito… 

Excertos

Leopardi

A vida, que é uma coisa linda, não é a que se conhece, mas a que não se conhece; não é a vida passada, mas a futura.

Opúsculos Morais, das Obras Completas de Giacomo Leopardi.

Excertos, Questões

Sinceridade

De quem tem medo, imbecil? Das pessoas que o estão olhando? Da posteridade, por estranho acaso? Bastaria uma coisa ínfima: conseguir ser você mesmo, com todas as fraquezas inerentes, mas autêntico, indiscutível. A sinceridade absoluta seria em si mesma um tal documento! Quem poderia suscitar objeções? Este é o homem, um dos muitos, se quiserem, mas um. Os outros seriam obrigados a levá-lo em consideração, estupefatos, pela eternidade.

 

 

Dino Buzzati, Naquele Exato Momento (Nova Fronteira, 1986, p. 11)

Íntimo & Pessoal, Textos próprios

Devir


Lá fora corre um rio que eu não sei de onde vem ou para onde vai. Ouço suas águas e sinto que o rio me ouve também. Eu quero ser uma folha largada neste rio e continuar sem ter destino. Eu quero ser apenas essa folha, girando, sem tocar margem nenhuma. Eu quero não poder parar.

Deus, Excertos, Filosofia, Humor

Árvore da Ciência

A serpente do paraíso, contestando a sua condenação, retruca:

Nada disso: dei à Eva o melhor conselho do mundo. Ela honrava-me com a sua confiança. Para mim, ela e seu marido deviam provar do fruto da árvore da ciência. Acreditava agradar assim ao senhor das coisas. Uma árvore tão necessária ao gênero humano não me parecia plantada para ficar inútil. Desejaria o Senhor ser servido por ignorantes e idiotas? Não é feito o espírito para esclarecer-se e aperfeiçoar-se? Não se deve conhecer o bem e o mal para praticar o primeiro e evitar o segundo? Por certo só me deviam agradecimentos.

 

Do conto “O Touro Branco”, de Voltaire.

Excertos, Frases

Respostas

Se você não tem certeza sobre as coisas, se sua mente ainda está suficientemente aberta para questionar o que vê, você tende a ver o mundo com grande cuidado, e dessa observação atenta vem a possibilidade de ver algo que ninguém viu antes. Você tem de estar disposto a admitir que não possui todas as respostas. Do contrário, jamais terá alguma coisa importante para dizer.

Paul Auster, do prefácio do livro Achei que meu pai fosse Deus e outras histórias verdadeiras da vida americana, pg. 17.

Excertos, Poesia, Questões

E a essa hora tardia!

Precisava de um amigo,
desses calados, distantes,
que lêem verso de Horácio
mas secretamente influem
na vida, no amor, na carne.
Estou só, não tenho amigo,
e a essa hora tardia
como procurar amigo?

Versos do poema “A Bruxa”, das Obras Completas de Carlos Drummond de Andrade